A diferenciação Pedagógica

07-10-2011 22:17

 

Num mundo global em que a sociedade é cada vez mais diferenciada, onde coabitam, classes, culturas, valores, tradições e crenças de vária ordem, assistimos a uma exigência constante, em que apesar das diferenças, tudo está organizado para uma acção de tratamento igual para com os diferentes. Este conceito implícito é bem patente na organização das nossas escolas, em que cada vez mais, as diferenças são tratadas com igualdade. Preocupa-nos assim, o currículo que determina e limita a acção da escola que acaba por ser indiferente e passiva face às desigualdades.

Um problema acrescido e óbvio nas escolas do 1º ciclo do ensino básico, é que elas têm de ensinar simultaneamente alunos muito diferentes, quer pelas características individuais, quer pela constituição de turmas com inclusão de várias anos de escolaridade.

Parece-nos que não é o número de alunos que cria o problema, mas o facto de que os alunos têm níveis e capacidades completamente diferentes, e os professores são coagidos pelo cumprimento de um, ou, podendo ir mesmo, até quatro programas. Para termos a certeza de um ensino eficaz, terão que ser consideradas as diferenças individuais, e grupais, e encontradas as estratégias apropriadas que permitam dar a resposta adequada em função das circunstâncias existentes, ou seja, o grupo alvo de alunos a quem se dirige a acção educativa. Conscientes de que só é possível alterarem atitudes e práticas educativas, em função do contexto circundante, sem a persuasão dos programas escolares, parece-nos evidente a necessidade de reformulação de currículos nacionais de modo que as escolas os possam tornar mais flexíveis, com possíveis reajustamentos, sem a preocupação actual, com a ênfase colocada na obtenção de resultados escolares. A natureza prática da situação é tal, que o problema é, em muitas situações, um desvirtuar as capacidades de uns em detrimento das de outros.

Quando o sistema escolar não pode ultrapassar a diversidade dos alunos, os professores recorrem a ensinar o aluno médio e, deste modo, todos são homogeneizados. Refira-se que também os currículos como estão estruturados, e os próprios manuais escolares adoptados são elaborados de modo a dar resposta a um tipo de alunos que se pretende formar e instruir.

Os professores têm consciência dos problemas que isto cria e sentem-se muitas vezes infelizes. Um educador disse: “...que no currículum e instrução nada é tão desigual como um tratamento igual dos desiguais”.

E um professor frustrado disse: “Quando acabo as minhas aulas em Junho, (as crianças) muitas estão um pouco mais rápidas e as rápidas estão um pouco mais lentas”.

Anima-nos a constatação que tal não acontece em todos os níveis de ensino, e ressalvamos a nossa realidade, a educação pré-escolar, onde se vai ao encontro de todos e de cada um, conscientes de que eles são dotados de capacidades, expectativas e interesses diferentes, sem que no entanto se privilegie mais uns em detrimento de outros. Move-nos o respeito por todos e cada um, sem o constrangimento do currículo imposto por outros, mas apenas partindo de um documento orientador da acção educativa, documento existente no nosso país, publicado em 1997 que se chama Orientações Curriculares para a Educação Pré-Escolar, e que, surgiu numa verdadeira partilha de saberes de profissionais (educadores e professores), e não de hábeis teorias, apontadas por senhores instalados em gabinetes, quantas vezes distanciados da realidade.

Orgulhamo-nos de ter participado na elaboração desse precioso documento, integrando o Círculo de estudos da ESE de Viseu, e acreditamos que à semelhança deste, podem ser elaborados outros, com a mesma intencionalidade e objectivos, que permitam aos professores combater a obsessão existente pelo cumprimento impiedoso dos programas, e apenas orientem a acção educativa, preparando pistas que permitam atingir metas. Permitimo-nos apresentar seguidamente, em anexo, uma fábula para animais, de autor desconhecido, texto que acreditamos nos possa fazer reflectir sobre a problemática da diferenciação pedagógica que urge implementar no nosso sistema de ensino que vise uma melhorias das nossas práticas educativas.

 

Vale a Pena Reflectir:

Uma Fábula para animais (de autor desconhecido)

 

Há muitos, muitos anos, os animais tinham uma escola.

O curriculum constava de: correr, trepar, voar, e nadar; e todos os animais aprendiam a mesma coisa.

O pato era bom a nadar; era de facto, mesmo muito melhor que o seu instrutor. No voo passou “rés-vés”, mas na corrida restavam-lhe poucas hipóteses. Como estava muito atrasado nesta disciplina foi obrigado a ter horas suplementares para praticar corrida, o que o obrigou a faltar às aulas de natação. E assim continuou até ter sofrível na corrida e na natação.

Mas sofrível é aceitável; por isso, ninguém se preocupou excepto o pato.

O coelho começou por ser o melhor da turma na corrida, mas, por causa das aulas de natação teve um esgotamento nervoso e teve que perder o ano.

O esquilo era o “às” na aula de trepar, mas o seu professor de voo obrigava-o a começar o voo arrancando do chão. Devido à fadiga resultante do esforço no arranque, vieram-lhe insuportáveis dores musculares e só a custo conseguiu obter 1 na corrida e 2 no trepar.

Os cães da pradaria tiveram de pôs os filhotes nas explicações do texugo, porque as autoridades escolares se recusaram terminantemente a incluir no currículo a área de cavar com as patas.

No final do ano, o único animal que figurava no quadro de honra era uma enguia anormal que nadava razoavelmente, que trepava um pouco, que voava um bocadinho.

 

Educadora Clarinda Pessoa